segunda-feira, 30 de março de 2009

O Que é Filosofia Medieval? (Carlos Arthur Nascimento)

[resumo por: Lia Freitas Oliveira¹]

O autor começa falando que em vários lugares escutamos falar da Idade Média. Na filosofia, na moda, nos livros de história e em muitos outros lugares. Mas, apesar de ser usada como referência por muitos, a Idade Média é apenas um período inventado por um pedagogo alemão chamado Christoph Keller, que definiu a divisão da história ocidental em antiga, medieval e moderna. Junto com essa divisão veio também a Idade Média foi o período das trevas no âmbito intelectual.

Contudo, este posicionamento é questionável e não aceito por outros estudiosos, visto que o período medieval teve uma vasta produção intelectual por parte de muitos homens, ainda hoje estudados, como Santo Agostinho e outros de também grande importância para a formação do pensamento cultural da sociedade cristã do Ocidente.

De fato, fica de difícil entendimento considerar a produção intelectual da Idade Média como “científica”, já que estamos direcionados a acreditar que ciência e religião não se misturam.

Os filósofos medievais se auto distinguiam dos filósofos pagãos – os que vieram antes de cristo – e dos infiéis – os que vieram depois de cristo e não eram cristãos. Intitulavam-se de “os santos”, hoje, sendo denominados de teólogos.

Baseados nas doutrinas bíblicas, assim nasceram as teorias da filosofia medieval. O autor cita o exemplo do apóstolo Paulo, que em diferentes passagens bíblicas, usa de estratégias opostas em suas pregações. Aos gregos, no livro de Atos dos Apóstolos, prega as Boas Novas de maneira racional e próxima à linguagem filosófica grega. Já na primeira carta aos Coríntios, usa de uma linguagem mais espiritualista e transcendente, tratando-se de estar falando a judeus pertencentes às baixas camadas da população. Daí nascem duas linhagens de cristãos: os que tomam influência da cultura pagã e os que crêem de maneira mais espiritualista, não aceitando a entrada de secularismos na fé bíblica. Da primeira linhagem saíram os homens que constituíram suas teorias como base do pensamento ocidental por longos séculos. Como principal referência desse sincretismo entre fé e razão temos Santo Agostinho.

Agostinho sofreu grande influência da idade antiga. Formulou seu pensamento sobre uma síntese de elementos da cultura antiga com o cristianismo, trazendo aos posteriores um ideal cultural e uma orientação filosófica.

Esse ideal cultural Agostinho toma de uma passagem bíblica do livro de Êxodo, em que Deus manda aos judeus que antes da diáspora tomem os utensílio de valor dos egípcios, pois aqueles bens eram seus por direito, era o pagamento de tantos anos de trabalho não recompensado. A partir desse trecho, Agostinho constrói a idéia de que os cristãos deviam espoliar-se dos bens culturais pagãos, já que os antigos não tinham direito de posse destes bens, pois ultilizavam-nos mal, com o fim de cultuar os seus falsos deuses.

Quanto à orientação filosófica, Agostinho formulou com base no livro do profeta Isaías capítulo 7, que diz: “se não credes, não compreendereis”, a necessária interação entre fé e razão. Segundo ele, para crer é preciso entender que se deve crer e que o objeto da minha crença não é algo absurdo e também é preciso entender o que eu creio, no caso a palavra de Deus.

Dentro desses parâmetros de relação entre fé e razão, a filosofia medieval foi evoluindo. Para que essa evolução se tornasse concreta, os estudiosos utilizaram-se de instrumentos na formulação de seus pensamentos. Em diferentes períodos, utilizaram-se da gramática, da dialética e da filosofia como instrumentos de auxílio.

O uso dessas artes liberais começou com o império de Carlos Magno, que se preocupou em incentivar o saber e a instrução no seu reino, através do monge formado em York de grande conhecimento em cultura clássica, o ilustre Alcuíno.

Alcuíno trouxe a influência clássica aos estudos teológicos de sua época como auxílio na compreensão dos textos bíblicos. Usava-se das artes liberais da antiguidade de todos os tipos: o trívio, que se preocupava com os vários aspectos da palavra (gramática, dialética, retórica) e o quadrívio, que se preocupava com disciplinas de caráter matemático (aritmética, geometria, música, e astronomia).

A partir de Alcuíno começa, mesmo que de maneira bastante discreta, a preocupação dos medievais em utilizar dessas artes para uma melhor interpretação dos textos sagrados.

Houve no final do século V d.C. um autor de origem desconhecida chamado Dionísio. Na época, pensava ser ele o Areopagita que se converteu pela pregação de Paulo no Areópago em Atenas. Por isso foi um autor muito prestigiado pelos medievais, pois o consideravam um herdeiro direto da geração de Cristo.

Muitos homens traduziram suas obras, mas o mais fidedigno e que promoveu os escritos de Dionísio na teologia ocidental foi João Scot Erígena. Ele foi o intelectual mais notável de seu século.

Scot Erígena concebia o trabalho intelectual da filosofia como uma “fé” que procura a inteligência através da interpretação das Escrituras. Buscou também entender a natureza formulando instâncias dialéticas. Sua forma de pensar assemelha-se a Anselmo de Catuniária e Pedro Abelardo.

Muitos utilizaram-se da dialética em seus estudos no período medieval, mas nem todos. Outros eram totalmente contra à utilização da dialética, como São Pedro Damião que dizia que usar da dialética para interpretação das escrituras era como misturar dançarinas de teatro com virgens puras. Segundo ele, o papel máximo que as artes liberais e a filosofia podem desempenhar é de “serva da teologia”.

Voltando aos teólogos mais “liberais”, Santo Anselmo de Ctuniária foi um deles. Anselmo trouxe de volta o “crer para entender” de Agostinho de maneira mais equilibrada. Entendia a fé como meio de buscar a compreensão. Na sua obra Proslogion, Anselmo busca de várias formas compreender Deus através de uma razão pautada na fé. Isto se confirma no trecho: “... por teu dom, eu anteriormente cri, já compreendo de tal modo, por tua iluminação, que se não quisesse crer que tu és, não poderia não compreender”.

Assim, Anselmo se esforça em seus argumentos para provar a existência de Deus, que acaba por colocar em relevo o caráter absoluto de Deus que é a sua existência em si.

No século XII, ocorreu uma espécie de renascimento na Europa ocidental. Muitas coisas passaram por mudanças e melhorias. Novas técnicas foram adquiridas na agricultura e na pecuária, o comércio e as cidades renasceram, fazendo com que as escolas se mudassem do campo para as cidades. Além dessas transformações, houve também melhorias nos métodos dos estudos teológicos da época. Melhorias estas que perduraram por vários séculos.

Um dos grandes influenciadores dessas transformações foi Pedro Abelardo. Sua principal contribuição encontra-se numa obra chamada “Sim e Não”, em que Aberlado utiliza-se de contradições e da dialética afim de levar à reflexão e ao descobrimento da verdade. Pois, para ele, a dúvida nos incita à pesquisa e esta nos leva à verdade.

Abelardo discute as “autoridades” (textos “polêmicos” dos Padres da igreja), sob a luz da dialética, dando origem às questões teológicas. Costumava colocar tudo em questão, inclusive a existência de Deus. Seus questionamentos foram indispensáveis na formação do novo método de trabalho intelectual dos séculos posteriores.

Outro grande nome de importância na formação desse renascimento metodológico foi Pedro Lombardo, que escreveu a obra Os quatro livros das sentenças, em que este novo método se consagrou. Foi adotada como texto oficial para o estudo da teologia durante quatro séculos. Lombardo utiliza-se de maneira moderada da dialética, não tão indagativo quanto Abelardo, nem tão radicalmente contra as artes liberais como São Pedro Damião. Por isso teve tanta aceitação durante tanto tempo.

As escolas de Chartres e de São Vítor, apesar de não tão citadas, também tiveram uma contribuição para os estudos de seu tempo. As duas utilizavam-se do trívio e do quadrívio para a investigação das sagradas Escrituras. A de Chartres predominava o uso do quadrívio. Da escola de são Vítor saíram nomes como Hugo, escritor da obra VII livros da erudição didas caliça ou Didascálion. Esta lembra a Doutrina cristã de Agostinho. Por conta disso, Hugo foi chamado de “novo santo Agostinho”. Ele dizia que as artes liberais devem ser estudadas em função da filosofia e esta em função da teologia que deve, por sua vez, conduzir à beatude.

Notamos que o espírito questionador esteve presente como mola propulsora dos trabalhos intelectuais do século XII. Percebe-se quando, mais uma vez, levanta-se a questão, até hoje discutida, sobre os gêneros e as espécies feita por Porfírio há vários séculos atrás. A pergunta era se gêneros e espécies, os universais, existem como realidade fora do nosso pensamento ou são puro produto da nossa atividade mental?

Muitas correntes de pensamento surgiram por conta dessa pergunta. Uns diziam que os universais tinham uma certa existência fora do pensamento (realistas), outros diziam que os universais eram meras palavras (nominalistas). Abelardo foi o primeiro a tratar desse questionamento detalhadamente. Tomou posição contra as correntes vigentes e fez sua apropria interpretação sobre o assunto.

Apesar de grandes avanços terem ocorrido no tempo de Abelardo, na época de Tomás de Aquino as coisas estavam bem mais evoluídas, facilitando a vida dos estudiosos do seu tempo. Alguns fatores são responsáveis por essa diferença: as traduções do grego e do árabe, o surgimento das universidades e a fundação das ordens mendicantes.

As traduções foram de suma importância para o progresso dos estudos. No tempo de Abelardo, o acervo das obras clássicas era bem limitado. Resumia-se em poucas obras traduzidas de maneira rude e cheia de termos apenas transliterados. A partir do século XII, houve uma invasão de traduções do grego e do árabe na Europa ocidental. Várias obras de Aristoóteles e de outros autores foram traduzidas. Isso ajudou sensivelmente o andamento dos estudos feitos após esse desenvolvimento e melhoramento do acervo literário.

As obras traduzidas vieram a ser guardadas nas universidades: instituições surgidas na primeira metade do século XIII. Funcionavam como uma corporação de ofício, onde se agrupavam profissionais do estudo de específicos assuntos para desenvolverem seus trabalhos e defenderem seus interesses. Por exemplo, uma universidade podia dedicar-se somente à teologia, ou só ao direito. As mais importantes do século XIII foram as de Paris, Oxford e Bolonha.

Lecionar e disputar era o papel de todo mestre. Isso foi importante para a assimilação dos textos traduzidos recém chegados na Europa. Ao lecionar o mestre explicava e comentava os textos escolhidos para o fim específico de seu curso. Já a disputa surgiu modelada a partir das questões nascidas no século XII. Era uma espécie de competição entre os estudiosos, em que eram discutidos problemas vigentes, onde defensores e oponentes do assunto argumentavam a fim de chegar a uma conclusão, que era dirimida pelo mestre. As disputas eram de dois tipos. Tinha a questão disputada (a mais comum), em que o assunto era previamente estabelecido e a questão quodlibetal, onde o tema era livre e no caso, bem mais arriscada.

Essas atividades foram muito úteis para a formação da produção literária da época. As disputas eram registradas por escrito. As consultas feitas aos mestres resultaram nos opúsculos. Dos textos usados para lecionar, os mestres faziam os comentários. Mas em todos esses tipos de obras, faltava certa organização e concisão na abordagem do assunto. Dessa necessidade surgiram as sumas, obras de caráter enciclopédico, pedagógico e sintético, muito peculiar à Idade Média.

Além de todo esse renascimento intelectual ocorrido nos séculos XII e XIII, houve também um renascimento religioso. Muitos voltaram a buscar a simplicidade e espiritualidade da igreja primitiva, retomando uma “vida postólica”. Essas tendências reformistas foram mal vistas pela igreja católica, sendo consideradas heréticas. Por estarem crescendo em adeptos, a igreja aceito algumas dessas ordens mendicantes. As mais importantes foram as dos Franciscanos e as dos Dominicanos, ambos de precioso papel na vida universitária dos séculos seguintes.

Voltando à questão dos textos traduzidos nos séculos XII e XIII, não foi tão simples a entrada destes textos na Europa. Eles não só causaram uma movimentação no âmbito intelectual, mas também nos clérigos católicos. Até antes desse renascimento, os textos apresentados para estudo e auxílio na compreensão das Escrituras, eram poucos e não mostravam ameaça à fé cristã. Porém, com a tradução de textos como os de metafísica, ética e sobre a natureza de Aristóteles, trouxeram pontos conflituosos à doutrina cristã. Sem contar que essas obras, muitas delas, vinham com comentários de árabes e judeus como Avicena e Avicebron, respectivamente, o que acentuava a discordância de pontos de vista. Assim a igreja como defensora da fé, proibiu a leitura de alguns desses livros. Isso gerou um conflito entre universidades e clérigos da Igreja. Ma s a insatisfação de mestres e estudantes não foi suficiente. Em 1277, o bispo de Paris, Estêvão Tempiere, condenou 219 teses, proibição desta vez bem mais ferrenha e castradora.

Durante esse vasto período de renascimento cultural que precedeu a proibição católica, muitos nomes importantes surgiram: Boaventura, Tomás de Aquino, Alberto Magno, Roger Bacon e Siger de Brabante. Fora Roger Bacon, que era da universidade de Oxford, os outros quatro vinham da universidade de Paris. Discordavam entre si não pelas suas influências acadêmicas, mas por pontos de vista pessoais.

Siger, mestre secular da faculdade de artes, tinha verdadeira veneração aos filósofos, em especial Aristóteles. Considerava que “filosofar é indagar simplesmente o que pensaram os filósofos e principalmente Aristóteles...”. Separava a filosofia da fé, dizendo que a verdade na revelação cristã.

Tomás de Aquino se opõe ao pensamento de Siger. Ele não separava a busca da intenção do autor e a busca da verdade. Assim, Tomás não separa filosofia e teologia, porém não as confunde.

A cerca disso, Boaventura dizia:

“Quando, de dois elementos, um passa ao domínio do outro, não se juga que haja mistura, mas sim quando a natureza de ambos se altera. Daí, aqueles que se servem dos ensinamentos filosóficos da sagrada doutrina reconduzindo-os ao acatamento da fé, não misturam água ao vinho, mas transformam a água em vinho.”

Já para Tomás de Aquino, na mistura entre filosofia e teologia, não haveria deturpação de ambas as partes, pelo contrário, a filosofia se estabeleceria em seu sentido pleno.

Enfim, os teólogos do século XIII e dos seguintes, apesar de suas divergências, tinham como ponto em comum que suas problemáticas teológicas tinham explicações filosóficas em si. A crítica filosófica dos séculos XII e XIV é sempre comandada por motivos teológicos.

As divergências seguem sempre a mesma linha: os que integram filosofia e teologia e os que separam as duas.

No século XIV acontece entre Duns Scot e Guilherme de Ockham, o ultimo sendo mais veemente quanto a separação entre filosofia e teologia. Os dois possuidores desse espírito “desconfiado” surgido após a condenação de 1277, denunciavam a impossibilidade de apoiar os dogmas cristãos sobre a filosofia.

Preparando terreno para o renascimento científico que viria no século posterior, surgiram os “calculadores”, que faziam suas análises científicas sobre física derivada de contextos puramente teológicos. Muitas de suas teorias sobre física foram usadas e desenvolvidas por Galileu no século XVII.

Por fim, o declínio da teologia medieval no final do século XIV era notório. O contexto histórico era complicado. Os intelectuais da Idade Média viam-se cansados de tentar conciliar ou separar filosofia e teologia, assim como cita Étienne Gilson:

“Muitos cristãos do século XIV estavam simplesmente fartos de todo este negócio. Eles não tinham o que fazer com a teologia especulativa, eles não se perderiam nos obscuros e inseguros mistérios da união mística; o que eles precisavam era de vida cristã prática direta e de nada mais”.

Concluímos que a filosofia medieval trouxe aos dias de hoje influências não só no âmbito religioso, mas também no cultural, filosófico e científico, sendo de total relevância o seu estudo e compreensão para o entendimento eficaz das teorias filosóficas modernas e contemporâneas.

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1. Lia Freitas Oliveira é aluna de Filosofia da Universidade Estadual do Ceará.

domingo, 29 de março de 2009

TÍTULO: A verdade na visão existencialista de Jean-Paul Sartre: possibilidades de desvelamento da realidade-humana.

AUTOR: Débora da Silva Paula

INSTITUIÇÃO: Universidade Estadual do Ceará

TITULAÇÃO: Graduanda em Filosofia

ORIENTADOR: Ms. Eliana Sales

RESUMO: O texto base utilizado nesse artigo foi a obra póstuma Verdade e Existência do francês Jean-Paul Sartre (1905-1980). Sartre foi um filósofo, ligado a corrente existencialista, que viveu em um período histórico marcado por duas grandes guerras mundiais, acontecimentos que o influenciaram em seus estudos sobre a existência. Em Verdade e Existência, escrita em 1948 e publicada somente após seu falecimento, o filósofo entende a verdade como algo que está ligado à liberdade e a questão da moral. No seguinte artigo, procuro demonstrar essa avaliação que Sartre faz sobre a verdade, com o intuito de chegar a uma conclusão sobre a questão da verdade como sendo relativa diante da existência do ser, através de uma análise do texto de apoio e de textos de outros autores que avaliam o pensamento sartreano.

PALAVRAS-CHAVE: Verdade. Realidade-humana. Liberdade. Sartre.

sábado, 28 de março de 2009

Francis Bacon

Francis Bacon também referido como Bacon de Verulâmio nasceu em Londres em 1561 e morreu em 1626 também em Londres. É considerado como o fundador da ciência moderna.

Francis Bacon acreditava ter nascido para servir a humanidade e reconhecia que o cuidado do bem comum estava entre os deveres a que o povo tem direito, aberto a todos, tal como as águas e o ar. Ele tinha paixão pela pesquisa, o poder de manter, com paciência, o julgamento em suspensão, de meditar com prazer, de concordar com cautela, de corrigir prontamente falsas impressões e de ordenar seus pensamentos com escrupuloso cuidado. Sua educação e sua criação haviam todas apontadas, não para a Filosofia, e sim para a política: ele tinha sido, por assim dizer, embebido na política desde a infância e acreditava que o seu dever para com o seu país lhe fazia exigências especiais, exigências essas que não podiam ser relegadas a segundo plano, não podiam ser reclamadas por outros deveres da vida. Mas sua esperança era de ser Filósofo e estadista. Não conseguia chegar a uma conclusão sobre se gostava mais da vida contemplativa ou da vida ativa, embora desconfiasse de que essa dupla direção de sua vida pudesse encurtar o seu alcance e reduzir suas realizações. Talvez devesse escolher e se focar em um só objetivo. Mas a todo momento ele pensava: “os estudos ou a sabedoria não podem ser um fim, um conhecimento não aplicado em ação, era apenas uma pálida vaidade acadêmica. Não pe que Bacon tenha aí, deixado de amar a dedicação aos livros e a sabedoria, tanto é que ele diz “sem filosofia, não quero viver.” Mas para ele, nada valia tudo conhecer apenas no campo teórico e nada disso utilizar em prol da melhoria da vida humana. Não admirava uma vida meramente contemplativa, desprezava o conhecimento que não levava a ação: “No teatro da vida, os homens devem saber que só os Deuses e os anjos devem ser expectadores.”

Então, o que percebemos fazendo algumas leituras de algumas obras, é um Bacon indeciso entre dois amores, a política e a Filosofia. Mas o fato é que seu coração estava com a filosofia. Ela foi sua companheira nos cargos exercidos, e seria o seu consolo na prisão e nas desgraças. Mas uma coisa que o incomodava fervorosamente era a estagnação da filosofia devido à persistência póstuma de métodos antigos. O mesmo incomodo lhe causava com relação a ciência. Para ele as ciências estavam estacionadas, sem receber quaisquer incrementos dignos da raça humana, e toda a tradição e sucessão de escolas ainda é uma sucessão de mestres e estudiosos, não de inventores. Mas esta ciência, por si só, não é suficiente: deve haver uma força e uma disciplina fora das ciências para coordená-las e dirigi-las para um objetivo, ou seja, o que a ciência precisa é de filosofia. Só a filosofia pode dar, até mesmo a uma vida de agitação e sofrimento, a nobre paz que resulta da compreensão. “O saber conquista ou alivia o medo da morte e de um destino adverso.” Porque a filosofia nos leva, primeiro a procurar os bens do espírito; o resto será fornecido, ou, simplesmente não nos fará falta. E a ciência se ressente muito dessa falta de filosofia. O exercício da política e da ciência se torna uma confusão destruidora, quando divorciada da filosofia.

O grande sonho de Bacon era a socialização da ciência para a conquista da natureza e a ampliação do poder do homem sobre essa natureza, mas a partir do momento que o homem se conscientizasse de que a natureza só passaria a ser comandada quando aprendermos as suas leis. E o que há de mais restaurador, de mais novo em Bacon é a magnífica segurança com a qual ele prediz a conquista da natureza pelo homem. Para ele, aquilo que o homem já fez é apenas uma garantia de tudo o que ele ainda fará. Mas porque tanta esperança se já muitos anos se passaram e a as evoluções ao longo do tempo produziram resultados tão modestos? Ora, o homem pode conquistar muito. Tudo é possível para o homem. Os homens não são animais eretos, são deuses imortais. Mas precisamos urgente de uma revolução implacável de nossos métodos de pesquisa e pensamento, no nosso sistema de ciência e lógica; precisamos de um novo organum, melhor do que o de Aristóteles, adequado a este mundo.

Porque melhor do que o de Aristóteles? Porque para Bacon, a filosofia estava atrelada ao erro dos filósofos gregos de passarem todo seu tempo dedicados a teoria e tão pouco a observação, essa filosofia tinha ficado estéril e precisava de um novo método para torná-la fértil. Devemos tornar, então, a ser como criancinhas, livres de ismos e abstrações, despidos de quaisquer preconceitos e predisposições. Temos que destruir os ídolos da mente. Esses ídolos que projetam a rejeição protestante da adoração da imagem, um pensamento confundido com uma coisa. Nunca progrediremos muito no caminho em direção a verdade, se esses ídolos ainda nos fizerem tropeçar. Precisamos de novos modos de raciocínio, novas ferramentas para compreensão. Métodos com base na teoria e na prática. Porque uma sem a outra é inútil e perigosa; conhecimento que não gere empreendimento é uma coisa pálida e anêmica, indigna de humanidade.

Uma outra característica interessante do pensamento de Bacon é a aceitação da ética epicurista. Para ele, nada poderia ser mais prejudicial a saúde do que a estóica repressão do desejo; de que adianta prolongar uma vida que a apatia transformou em morte prematura? Trata-se de uma filosofia impossível, porque a qualquer momento o instinto ira rebelar-se. “a natureza está muitas vezes oculta, às vezes dominada, mas raramente extinta.” Ou seja, Bacon aceita essa condição ambígua do individuo. Corpo e alma. E essa parte de nós que não se pode salvar, deve ser respeitada dentro de suas limitações e deve ter sua existência prolongada se for possível. Isso fica evidente quando ele fala que o médico tem que se dedicar a estudos que prolonguem a vida, que não se contentem em atuar como simples curandeiros, mas como distribuidores de maior felicidade terrena. Para Bacon a vida era uma coisa boa.


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Trabalho apresentado à Doutora Mª Terezinha de Castro Callado, pela aluna da graduação de filosofia da UECE Lorena Maciel afim de nota para a disciplina de História da Filosofia III.

Sêneca

Lucius Annaeus Sêneca (4 a.C - 65 d.C.) nasceu em Córdoba, Espanha. Filho de Annaeus Sêneca, conhecido como Sêneca, o velho, que teve renome como retórico e do qual restou apenas uma obra escrita, intitulada Declamações. Sêneca (filho) foi educado em Roma, onde estudou a retórica ligada à filosofia. Em pouco tempo tornou-se famoso como advogado e ascendeu politicamente, passando a ser membro do senado romano e depois nomeado questor. O triunfo político não se fazia sem conflitos e o renome de Sêneca suscitou a inveja do imperador Calígula, que pretendeu desfazer-se dele pelo assassinato. Contudo Sêneca foi salvo e, o próprio Calígula, veio falecer antes. Sêneca pôde continuar vivendo em relativa tranqüilidade, mas esta não dura muito tempo. Em 41 d.C. foi desterrado para a Córsega, sob a acusação de adultério, supostamente com Júlia Livila, sobrinha do novo imperador Cláudio César Germânico. Na Córsega, Sêneca passaria quase dez anos em grande privação material. Em 49 d.C., Messalina, primeira esposa do imperador Cláudio e responsável pelo exílio de Sêneca, foi condenada à morte. O imperador Cláudio casa-se então, com Agripina. Pouco tempo depois, Agripina manda chamar Sêneca para que este cuidasse da educação de seu filho Nero. Em 54 d.C., quando Nero se torna imperador, Sêneca passa a ser seu principal conselheiro. Esse período estende-se até 62, quando Sêneca deixa a vida pública e sofre a perseguição de Nero, que acaba por condená-lo ao suicídio. Não foi a lógica dos estóicos gregos, nem mesmo sua teoria do mundo físico, que atraiu o interesse dos estóicos romanos. Foi, antes, sua moral da resignação, sobretudo nos aspectos religiosos que ela permitia desenvolver. Sêneca foi o primeiro representante do estoicismo romano. O Pórtico, (a escola estóica recebeu o nome de Pórtico, devido ao fato de que Zenão de Cício ministrar aulas a seus discípulos sob a colunata em Atenas, conhecida por esse nome). Já com Panécio e Possidônio tinha aberto as portas à verdade e aos dogmas de outras escolas e, foi ainda mais sensível com Sêneca às instâncias ecléticas. O filósofo romano reafirmou a sua liberdade espiritual diante dos dogmas da escola. Dizem que Sêneca não é um eclético, porque essa sua liberdade característica enraiza-se num sentimento autenticamente estóico. Dizem, que as conclusões às quais Sêneca chegava eram, na sua maioria, alcançadas intuitivamente, sem que ele soubesse elaborar categorias teoréticas adequadas, para substituir as elaboradas pelos antigos estóicos. Sêneca é certamente um dos expoentes do Pórtico no qual são mais evidentes as oscilações a respeito do pensamento sobre Deus. Todavia, o ponto no qual a especulação de Sêneca é mais original está na psicologia, na sondagem das vozes interiores da alma humana e na capacidade de captar e interpretar o sentimento interior de divino. Em sua carta 41, escreve Sêneca: "Não se trata de levantar as mãos para o céu ou de pedir ao guardião do templo que nos permita aproximar-nos dos ouvidos dos simulacros, de modo que possamos assim ser melhor escutados. Deus te é próximo, está contigo, dentro de ti (...)". Podemos perceber que o Deus de Sêneca tem pouco em comum com os traços do Deus Pneuma dos antigos estóicos. Assim como Deus, outros são os temas tratados por Sêneca. As Cartas Morais de Sêneca, escritas entre os anos 63 e 65 e dirigidas a Lucílio, misturam elementos epicuristas com idéias estóicas e contêm observações pessoais, reflexões sobre a literatura e crítica satírica dos vícios comuns na época. Entre os seus doze Ensaios Morais, destacam-se: Sobre a Clemência, cautelosa advertência a Nero sobre os perigos da tirania; da Brevidade da Vida, análise das frivolidades nas sociedades corruptas, e Sobre a Tranqüilidade da Alma, que tem como assunto o problema da participação na vida pública; as Questões Naturais expõem a física estóica enquanto vinculada aos problemas éticos. Além dessas obras propriamente filosóficas, Sêneca escreveu ainda nove tragédias e uma obra-prima da sátira latina, Apolokocintosis, que ridiculariza Nero e suas pretensões à divindade. Todas essas obras, dizem os estudiosos, revelam que Sêneca foi, sobretudo, um moralista. A filosofia é para ele uma arte da ação humana, uma medicina dos males da alma e uma pedagogia que forma os homens para o exercício da virtude. O centro da reflexão filosófica para Sêneca, deve ser, portanto, a ética; a física e a lógica devem ser consideradas como seus prelúdios.
TITULO: As Formas de Conhecimento Segundo Benedictus de Spinoza

AUTORA: Brena Késia da Costa Chagas

INSTITUIÇÃO: UECE

TITULAÇÃO: Graduanda em Filosofia

ORIENTADOR: Dr. Emanuel Ângelo Fragoso

RESUMO: Nosso objetivo com o seguinte trabalho é apresentar e analisar as formas de conhecimento definidas pelo filosofo holandês, Benedictus de Spinoza. Pretendemos também apresentar o que é necessário para se chegar ao verdadeiro conhecimento, que, segundo o filosofo, é o que contém a felicidade suprema. Para tal, iremos abordar o tema em sua obra, Tratado da Correção do Intelecto. Nessa obra, Spinoza divide as formas de conhecer em quatro. A primeira forma é o conhecimento por ouvir dizer ou por qualquer outro sinal o qual se pode chamar arbitrário; em seguida temos o conhecimento por uma vaga experiência, ou seja, por uma experiência não determinada pelo intelecto; podemos observar também o conhecimento no qual a essência de uma coisa é retirada a partir de outra, ou por uma relação de causa e efeito; e, finalmente, temos o conhecimento em que a coisa é percebida por sua essência unicamente ou por sua causa próxima.


PALAVRAS-CHAVE: Spinoza. Conhecimento.
TÍTULO: Em que sentido o ser torna-se sujeito ou objeto segundo Jean-Paul Sartre.

INSTITUIÇÃO: Universidade Estadual do Ceará

AUTOR: Ravena Olinda Texeira

TITULAÇÃO: Graduanda em Filosofia

ORIENTADOR: Ms. Eliana Paiva

RESUMO: O presente artigo tem por objetivo expor, tornando clara a visão ontológica do filósofo, existencialista francês, Jean-Paul Charles Aymard Sartre (1905- 1980) em relação ao ser como sujeito e objeto em meio as relações sociais, enfocando como a verdade e a liberdade podem estar ligadas a essa questão e como elas interferem nesse estado momentâneo do ser, sendo que essas análises foram realizadas conforme algumas reflexões e comparações entre seus escritos fenomenológicos que estão presentes nas obras O Ser e o Nada (1943), que condensa todos os conceitos importantes da primeira fase de seu sistema filosófico, e Verdade e Existência (1948), onde o autor trata dos mesmo temas embora afirme que está buscando uma moral.

Palavras-Chave: Sujeito. Objeto. Verdade. Liberdade. Sartre
TÍTULO: Fascismo e Marxismo: Da idéia de Nação ao Totalitarismo

INSTITUIÇÃO: Universidade Estadual do Ceará

AUTOR: Fernando Luiz Duarte Junior

TITULAÇÃO: Graduando em Filosofia

ORIENTADOR: Ms. Eliana Paiva

RESUMO: Thierry Maulnier escreveu muito sobre o Fascismo talvez até o admirando, em seu começo, depois seguiu uma linha um pouco mais crítica a esse regime, acreditando que a natureza humana é mutável sim, e a história é dinâmica. Maulnier percebeu que no decorrer do tempo o Fascismo subverteu-se como uma prática política oportunista, populista e reformista, militarista e provavelmente determinista. O Fascismo nasceu como uma corrente política de exaltação ao Estado, com um projeto social de cunho “esquerdista”, no começo do século XX na Itália, porém, propondo métodos burgueses para corrigir as desigualdades. O Marxismo, que nasceu de Marx e Engels no século XIX tentava mostrar a história como algo dialético, em constante movimento, e que as revoluções eram algo mais que comum, era natural. O Fascismo tentando combater essa “naturalidade” nas revoluções se impôs como uma idéia política para abafar esses movimentos, e tentar fazer com que não crescesse o exemplo da Revolução Russa, por toda a Europa.

PALAVRAS-CHAVE: Fascismo. Marxismo. Nacionalismo. Totalitarismo.

Filebo (Platão)

Personagens: Sócrates, Filebo, Protarco.

A felicidade do homem:

Filebo defende que está na vida atendida pelo prazer. O prazer seria o bem da vida para levar o homem a felicidade.

Sócrates defende que está na vida que atende a sabedoria. O bem na vida seria seguir o caminho da reta razão, assim, o homem estaria seguindo feliz realmente.

Filebo sustenta que o prazer é a verdadeira meta para a qual devem esforçar-se todos os seres vivos, o bem supremo de todos, enquanto existirem, e que, a rigor, esses dois nomes, bom e agradável, se aplicam a uma só coisa da mesma natureza. Por sua vez, Sócrates nega que seja uma só coisa; tratando-se de nome diferentes, o bom e o agradável se distinguem um do outro pela própria natureza, e que na constituição do bem a sabedoria contribui com maior contigente do que o prazer. (Platão, Filebo, p. 39)

Sócrates defronta o caráter múltiplo e, por vezes, até oposto do próprio prazer. O prazer, mostra Sócrates, que muitas vezes ele se contradiz, não obtendo um caráter único, podendo variar de homem para homem e em cada situação. E até mesmo para o prazer ter seu gozo conseguido pelo homem ele necessita da sabedoria, do conhecimento.

Uma das questões pode ser exemplificada assim: Um homem em uma terra que ele sente demasiado calor, para ele, um lapso de frio seria prazeroso. Agora se ao inverso, um homem estivesse em uma terra que ele sente demasiado frio, um momento de calor seria, por esse viés, o seu prazer. Com esse exemplo demonstra-se: O prazer pode ser inverso. Seu caráter pode ser até mesmo nulo, pois, tomando que para um é o calor, o prazer, o outro tomará como o frio. Assim, não se podendo chegar ao acordo do que seria o prazer. Aqui com esse exemplo fica claro a questão da possível oposição que o entendimento de prazer teria. A questão de que para se entender o prazer precisaria do conhecimento, que no caso é nele que Sócrates afirma que está a felicidade do homem, pode ser exemplificada da seguinte maneira: Só se pode conhecer o prazer através do seu inverso (o desprazer). Para usufruir do prazer como felicidade o homem teria que pressupor dois conhecimentos, seriam eles: o conhecimento do seu desprazer, e o conhecimento do que seria o seu prazer que seria oposição a esse desprazer. Por exemplo: Um homem sente terrivelmente dor nos seus pés, pois, seu sapato é 38, quando ele calça 40; é notável seu desconforto e descontentamento. Ele corre para casa ao fim de seu expediente para poder “jogar” os sapatos para o alto e ver seus pés livres daquele “aperto”. Ele seria capaz até mesmo de “gemer” de prazer, ao aliviar seus pés daquele martírio doloroso. Duas coisas são mostradas com esse exemplo. A primeira é que o homem só sente o prazer (o alívio dos pés livres) porque antes teve o desprazer (o seus pés apertados), para ter o seu prazer ele precisaria tirar os sapatos, ele sabia disso. Pressupõe o conhecimento que seu martírio é causado por determinada coisa, e que seu prazer por outra. O homem faz essa deliberação (tirar os sapatos para obter o prazer que deseja) com o conhecimento do que seria o seu prazer. O prazer seria então encarado como algo que se quer não por si, mas, por causa de um desprazer, e, o homem teria que ter o conhecimento de ambos. Ficando assim, o conhecimento ainda acima do simples prazer para a felicidade. Pois, se o homem não tem o conhecimento ele não pode entender a dor e o que faz a falta dela.

O homem sábio estaria buscando a sapiência plena por saber que tudo que participa desse plano racional é o mais próximo da completude. O saber traz a felicidade ao homem, pois, a irracionalidade completa faria do homem um objeto, transeunte, ao acaso. Seria esse um homem feliz?

Voltando ao caso do prazer como o bem, que é levantado por Filebo e defendido por Protarco. O prazer não poderia ser o bem a ser almejado pelo homem porque o prazer muitas vezes pode até mesmo trazer algo de mal para o homem. Enquanto que a sabedoria participa do Bem, e só poderá dela vir para o homem o concordante.

Sócrates encerra afirmando que nem o prazer nem a inteligência são bens absolutos, pois, ambos são insuficientes e imperfeitos. Protarco concorda, deixando de lado a idéia de Filebo que seria o prazer o bem absoluto. Porém, Sócrates afirma que a inteligência está mais próxima desse bem absoluto do que o prazer, fazendo assim com que sua idéia que a sabedoria seja vista como melhor para se almejar ao bem do que o prazer acabe vencendo.

No Diálogo o tema central da discussão é realmente essa questão do prazer, da sabedoria e da felicidade do homem. Mas, são abordados outros temas como a questão do Uno, dos múltiplos, do finito e do infinito, da verdade e da opinião, dentre vários.

As Disciplinas de Filosofia

As disciplinas mais centrais e gerais da filosofia são as seguintes:

  • Metafísica
  • Epistemologia
  • Ética
  • Filosofia Política
  • Lógica

A metafísica estuda problemas relacionados com os aspectos mais gerais da estrutura da
realidade, nomeadamente os seguintes: a natureza da verdade; a independência do mundo
relativamente à nossa experiência; a natureza da objectividade e da subjectividade; a
identidade pessoal; o livre-arbítrio; o sentido da vida; a natureza da modalidade e a
existência de mundos possíveis; a identidade, a persistência e a substância dos objectos;
acontecimentos e substâncias; universais e particulares; a noção de causalidade e de lei da
natureza; problemas conceptuais do espaço e do tempo. A ontologia é a parte da
metafísica que estuda a existência ou o que há: que tipo de existência têm os números, ou os
universais? Que tipo de existência tem um acontecimento ou uma proposição? Os temas
introdutórios mais comuns no que respeita à metafísica são a identidade pessoal, o livrearbítrio
e a persistência dos objectos.

A epistemologia estuda problemas relacionados com o conhecimento em geral,
nomeadamente os seguintes: a análise de conhecimento como crença verdadeira justificada;
a estrutura da justificação cognitiva (fundacionalismo, coerentismo, externalismo, teorias
causais, etc.); o problema do cepticismo; fontes de conhecimento (conhecimento a priori e
a posteriori, indução, testemunho, etc.). Os temas introdutórios mais comuns no que
respeita à epistemologia são a análise de conhecimento, as teorias da justificação
(fundacionismo e coerentismo) e o problema do cepticismo.

A ética (ou a filosofia moral) estuda problemas relacionados com o modo como devemos
viver e com o que devemos valorizar. A ética abrange três áreas ou subdisciplinas distintas:
a metaética, a ética normativa e a ética aplicada. A metaética estuda problemas mais
abstractos, relacionados com a natureza da própria ética; a ética normativa estuda
diferentes sistemas éticos; e a ética aplicada estuda problemas práticos, como o aborto ou a
eutanásia. Eis alguns problemas da ética em geral: o egoísmo (ético e psicológico); a Regra
de Ouro; a natureza da normatividade e da razão prática; a objectividade do juízo ético;
responsabilidade moral, deliberação e decisão; acrasia; relativismo ou realismo éticos; a
incomensurabilidade de valores. Algumas das teorias normativas mais importantes são a teoria das virtudes, o utilitarismo e a ética deontológica. Alguns dos problemas mais
estudados em ética aplicada são os seguintes: o aborto, a eutanásia, o estatuto moral dos
animais não humanos, a ética do meio ambiente e o problema ético da pobreza no mundo. A
ética aplicada deu entretanto origem a várias subdisciplinas próprias, como a ética
empresarial, a ética jornalística, a ética médica, a bioética em geral, a ética universitária, etc.
Os temas introdutórios mais comuns no que respeita à ética prática são o aborto, a
eutanásia e os direitos dos animais; no que respeita à ética normativa, esses temas são o
utilitarismo, a ética de Kant e o egoísmo; e no que respeita à metaética o tema mais comum
é o relativismo ético.

A filosofia política consiste na aplicação da filosofia (da ética principalmente) a questões relacionadas com os indivíduos enquanto organizados sob a égide de um Estado. Ela investiga questões do seguinte tipo: Um indivíduo possui direitos que contrariam os interesses do Estado? Há no Estado algo mais além dos indivíduos que o constituem? É a democracia a melhor forma de governo?

A lógica estuda e sistematiza a argumentação válida. A lógica tornou-se uma disciplina
praticamente autónoma em relação à filosofia, graças ao seu elevado grau de precisão e
tecnicismo. Hoje em dia, é uma disciplina que recorre a métodos matemáticos, e os lógicos
contemporâneos têm em geral formação matemática. Todavia, a lógica elementar que se
costuma estudar nos cursos de filosofia é tão básica como a aritmética elementar e não tem
elementos matemáticos. A lógica elementar é usada como instrumento pela filosofia, para
garantir a validade da argumentação.

Existem também as diciplinas também de importância no estudo da filosofia mas que não são consideradas centrais como:

  • Filosofia da religião
  • Estética e filosofia da arte
  • Filosofia da ciência
  • Filosofia da mente
  • Filosofia da linguagem
A filosofia da religião estuda temas como os seguintes: argumentos a favor e contra a
existência de Deus, como os argumentos ontológico, do desígnio ou cosmológico, e o
problema do mal; a racionalidade e a epistemologia da fé; a natureza de Deus e as suas
propriedades; filosofia da linguagem religiosa; a ideia de alma e de imortalidade. Os temas
introdutórios mais comuns no que respeita a esta disciplina são os argumentos a favor de
Deus e as suas críticas, o problema do mal e o fideísmo.

A estética e a filosofia da arte são subtilmente distintas, mas hoje em dia estuda-se
sobretudo a última. A estética estuda a natureza do juízo estético em geral; a filosofia da
arte estuda problemas como a definição de obra de arte e o valor da arte. O tema
introdutório mais comum no que respeita a esta disciplina é a definição de obra arte,
estudando-se em geral as várias teorias que respondem a este problema.

A filosofia da ciência estuda aspectos epistemológicos, metafísicos e lógicos relacionados
com as ciências em geral, incluindo as ciências da natureza e as ciências humanas. Eis
alguns dos temas estudados nesta disciplina: a relação entre teoria e observação; a
confirmação de teorias científicas; a interpretação da probabilidade; a noção de explicação
científica e de leis da natureza; realismo e anti-realismo científicos; incomensurabilidade de
teorias; o estatuto dos inobserváveis; unidade e diversidade das ciências. A filosofia das
ciências tem dado origem a várias subdisciplinas especializadas: filosofia da biologia,
filosofia da física, filosofia das ciências humanas e filosofia da história. Os temas
introdutórios mais comuns no que respeita a esta disciplina são a relação entre observação e
teoria, o problema da confirmação (indutivismo e falsificacionismo), realismo e antirealismo
científicos, e o problema da demarcação (entre ciências e não ciências).

A filosofia da mente estuda problemas metafísicos e epistemológicos relacionados com
os fenómenos mentais. Eis alguns dos temas estudados nesta disciplina: a relação mentecorpo
— fisicismo, dualismo, funcionalismo; o problema da causalidade mental; a existência
de mentes alheias (o problema do solipsismo); o valor da introspecção e a autoridade da
primeira pessoa com respeito aos seus estados mentais; os fenómenos mentais: consciência
e experiência, qualia, conteúdo perceptivo; intencionalidade e atitudes proposicionais;
internalismo e externalismo mental; o papel e a natureza das emoções; a natureza da acção;
acrasia. Tanto a filosofia da linguagem como a metafísica e a filosofia da psicologia estão
intimamente relacionadas com a filosofia da mente. Os temas introdutórios mais comuns
no que respeita a esta disciplina são as teorias fisicistas, dualistas e funcionalistas sobre o
problema da mente-corpo e o problema do solipsismo.

A filosofia da linguagem estuda todos os problemas relacionados com o funcionamento
da linguagem e o fenómeno do significado linguístico. Eis alguns dos temas desta disciplina:
a natureza do significado — significado, verdade e realismo, indeterminação; pragmática; a natureza do conhecimento do significado e das regras linguísticas; o problema da
referência: indexicais e demonstrativos, nomes próprios, descrições definidas, quantificação
e anáfora; atitudes proposicionais; sentido, força e modo; advérbios e quantificação sobre
acontecimentos; a distinção entre diferentes línguas, linguagens e idiolectos; o significado
das metáforas. Os temas introdutórios mais comuns no que respeita a esta disciplina são as
teorias da referência e as descrições definidas.

PS: Nessa Organização de Desidério Murcho para a revista Crítica ele coloca Filosofia Política como disciplina não central. Optei por colocá-la como central ao ver que a Ética trata mais da teoria e sistemas que da própria prática que viria na Filosofia Política, sendo de tamanha importância, a meu ver, colocando-se assim como disciplina central para o estudo da Filosofia.

Fonte: Renovar o Ensino da Filosofia. Lisboa: Gradiva, 2003.

Michel de Montaigne

Michel Eyquem de Montaigne nasceu no dia 28 de fevereiro de 1533 e faleceu no dia 13 de setembro de 1592, em Périgord na França, provinha de uma família rica de comerciantes que crescera através do processo de ascensão da burguesia. O período vivido por Montaigne era uma época conturbada, onde os feudos estavam caindo e dando lugar aos burgueses. Sem deixar de comentar sobre as questões religiosas, que o homem deixa o teocentrismo e passa a ver o antropocentrismo. Questões estas muito abordadas por Montaigne, tanto as religiosas que ele colocava como algo cultural quanto à do homem, na qual ele atribuía às paixões algo normal, ou seja, que concerne ao homem.


Montaigne teve uma educação muito rígida e aos seis anos foi mandado para o colégio de Guyenne, em Bordeaux, lugar onde teve suas primeiras influencias que foram a de dois grandes humanistas da época, os professores George Buchanan e M.A. de Muret.


Em 1554 formou-se em direito e em 1557 ele conhece quem se tornaria seu grande amigo Étienne de La Boétie, amizade sobre a qual escrevera muitas páginas. Mas em 1563 seu amigo faleceu assim Montaigne tornou-se extremamente melancólico e recolheu-se à torre do castelo de sua família, na qual traduziu a “Teologia Natural” do espanhol Raymond Sebond, editou os “Opúsculos” do seu amigo Étienne de La Boétie e escreveu os “Ensaios”, o livro I e o começo do livro II, que é uma obra totalmente inovadora, pois Montaigne escreve sem regras ou metodologia, com seu modo de escrever simples ele utiliza-se de casos muitas vezes do seu próprio cotidiano.


Em 1565 casa-se aos 32 anos com Françoise de La Chassaigne filha de um conselheiro do parlamento de Bordeaux. Os filhos que teve morreram e sobreviveu somente uma menina frágil e enferma de nome Eleonor. Em 1576 escreve “Apologia de Raymond Sebond” sua obra mais comentada. Em 1578 recomeça a escrever o livro II dos Ensaios e em 1580 publica os dois primeiros livros. De 1581 a 1585 torna-se prefeito de Bordeaux e em 1586 a 1588 termina os Ensaios, encerrando o livro III.


Montaigne era um homem heterogêneo, pois ao mesmo tempo em que era inovador, era conservador e tentava atribuir ao homem as religiões como algo cultural e dizia que ele tinha que fazer parte da política. Foi muito elogiado por Montesquieu, Voltaire, Alfieri, Foscolo, Leopard, na Inglaterra por Shakespeare, nos Estados Unidos o ensaísta e poeta Ralph Waldo Emerson e criticado por Chateaubriand, suas principais influências ao longo de vários textos ele mesmo deixa claro que se encanta muito com os estóicos, com Cícero e Plutarco.


UMA BREVE INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO DE MONTAIGNE A PARTIR DE RAYMOND SEBOND

Montaigne (1533 – 1592) nos Ensaios livro II no capítulo XII intitulado: Apologia de Raymond Sebond, que ele fala que o que sabe deste é que foi um médico espanhol que vivera cerca de duzentos anos antes dele, Montaigne já à luz do modernismo afirma:

É em verdade a ciência coisa importante e útil. Os que a desprezam dão prova de estupidez. Não considero, entretanto, seu valor tão elevado quanto o imaginam alguns (...) que a encara como o soberano bem e lhe atribui o poder que não tem, a meu ver, de nos tornar sensatos e satisfeitos. (p.175)

Montaigne deixa claro que não é contra a ciência, mas, ela não é a salvação do mundo, nem tem o poder que imaginam os tantos “modernistas” que são contemporâneos a ele e nem os que estão porvir. Ele sempre deixou claro em alguns de seus escritos que admirava os “antigos” como: Sêneca, Lucrécio, Plutarco; sempre mostrou muito conhecimento acerca destes. Possuidor de uma grande biblioteca mostrava grande conhecimento cultural e intelectual. Por estar muito ligado com os “antigos”, ele ainda não estava totalmente inserido no pensamento moderno, ele tenta resgatar o brilhantismo da dúvida que os antigos tinham, pois, os modernos estavam preocupados, no tempo, com as respostas, e se perdiam na objetividade e pragmatismo extremo da ciência, crendo totalmente na empiria para tudo, esquecendo-se que as coisas no mundo sempre mudam e que nunca terá uma única resposta, invariável durante o tempo. Deste ponto ele mostra-se um pirrônico por acreditar que nunca encontramos as respostas aqui, muitos afirmam que Montaigne é um cético por não querer dar respostas e por saber que é difícil encontrá-las nesse método científico que a cada dia se renova.

O filósofo francês de Périgoux direciona críticas também a todos que querem explicar a fé (incluindo os cristãos de seu tempo) e fala que a fé não deve ser explicada porque os métodos humanos não são capazes. No mesmo Raymond Sebond ele faz a defesa da fé em Deus criticando os que tentam achar razões para isto fundando-se apenas em diâmetros humanos. Para ele não se pode explicar a fé nem Deus por métodos puramente humanos, pois são coisas que dependem da graça divina.

(...) os cristãos se enganam em querer sustentar com argumentos puramente humanos uma crença que só se concebe pela fé e por intervenção particular da graça divina. (p.177)

A ciência, Deus, a fé, os animais, todos estes assuntos são tratados nesse único e gigantesco capítulo (XII) dos Ensaios (livro II). Montaigne faz também uma defesa esplendorosa dos animais.

Essa falha que impede nossa comunicação recíproca tanto pode ser atribuída a nós como a eles, que consideramos inferiores. Está ainda por se estabelecer a quem cabe culpar de não nos entendermos, pois se não penetramos o pensamento dos animais, eles tampouco penetram os nossos e podem assim nos achar tão irracionais quanto nós os achamos. (p.187)

Para Montaigne os animais como nós possuem sentimentos e inteligência, o que nos diferencia é a comunicação. Expressamo-nos por voz, por gestos, por sutis movimentos, e os demais animais não se excluem destes modos. Assim como os homens há animais que se organizam em sociedade, que buscam o melhor habitat, e que fazem arte. Porque nos achamos superior só por não os entendermos? Diz Montaigne que a natureza deu a todos os animais as mesmas condições para que vivam. E entre as várias comparações citadas por Montaigne está essa:

Se choramos, também choram os animais. Há bem poucos que não fiquem a gemer e lamentar-se durante muito tempo ainda após o nascimento, o que é inerente ao seu estado de fraqueza. Quanto a alimentar-se, é coisa natural neles como em nós; não há como ensiná-la, pois ‘todo animal sabe de suas forças e necessidades’. Atingida a idade em que o peito já não lhe basta, a criança pede comida. E a terra produz espontaneamente, e oferece ao homem, em quantidade suficiente, o que necessita para sua alimentação, sem que seja preciso cultivo ou preparação. Nem sempre, é certo; mas os animais como nós – comprovam-no as formigas – sabem fazer provisões para as estações estéreis do ano. (p.190)


DE COMO FILOSOFAR É APRENDER A MORRER

Essa obra está composta no livro I no qual Montaigne acaba acrescentando, pois escreve no mesmo período em que ele se encontra doente e espera pela morte. A obra faz uma comparação entre a morte e a filosofia, onde para Montaigne filosofar é o mesmo que contemplar, tirando a alma para fora do corpo, assim como a morte.

Montaigne também aborda sobre o prazer colocando como algo a ser buscado, mas os meios utilizados para busca desse prazer são as angústias. Michel escreve que o homem não pensa na morte como algo comum de sua existência e comenta do medo dos homens em falar sobre esse assunto.

O autor ao longo do texto faz várias reflexões, tanto da morte e de como o homem lidar com essa situação, sobre como a filosofia pode ser um modo de reflexão sobre a morte, também reflete sobre o prazer e como o homem tenta se enganar colocando o prazer como algo explicativo para a sua existência e esquece da morte.

Esse texto abordado por Michel de Montaigne se torna importante por falar sobre o momento vivido por ele que é a espera da morte e como ele produz o texto não contendo metodologias, a obra também é interessante, pois esta obra se diferencia das outras por abordar um conteúdo de acordo com o título, deixando sempre perguntas para que o leitor possa refletir sobre o assunto colocando sua opinião no texto e dando exemplos do cotidiano.

Na conclusão do texto Montaigne mostra que a morte ou a espera dela nos muda e que a algo imprescindível e que concomitantemente que nos muda nos torna iguais a todos, pois todos terão esse mesmo fim.

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Trabalho apresentado à Doutora Mª Terezinha de Castro Callado, pelos alunos da graduação de filosofia da UECE Fernando Luiz Duarte Jr e Kedna Adriele Timbó, afim de nota para a disciplina de História da Filosofia III.

Thomas Hobbes

Thomas Hobbes nasceu em Westport, em 1588. Filho de clérigo, Hobbes, em 1608, sai da Universidade de Oxford e se torna preceptor do filho de Lord Cavendish. Durante toda sua vida, ele será o amigo devotado dos Stuarts. Antes mesmo da revolução de 1648, que vai suprimir o poder real, ele foge da Inglaterra, onde se sente ameaçado por causa de suas convicções monarquistas. Viajará por diversos países da Europa, notadamente pela Itália (encontrará Galileu em Florença) e sobretudo pela França (encontrará o padre Mersenne em Paris). Retornará à Inglaterra por ocasião da restauração de Carlos II em 1660.

Em 1642, ele publica em Paris o De Cive e, em 1651, faz publicar em Londres o Leviatã ou matéria, forma e autoridade de uma comunidade eclesiástica e civil. O Leviatã será traduzido para o latim em 1688, em Amsterdam, mas nunca foi integralmente traduzido para o francês.

Hobbes é um empirista inglês e nele encontramos os temas fundamentais que serão sempre os da escola. A origem de todo conhecimento é a sensação, princípio original do conhecimento dos próprios princípios: a imaginação é um agrupamento inédito de fragmentos de sensação e a memória nada mais é do que o reflexo de antigas sensações.

Todavia, Hobbes crê na possibilidade de uma lógica pura, de um raciocínio demonstrativo muito rigoroso. Ao lado de uma indução empírica aproximativa, que da experiência passada conclui, sem prova decisiva, o que se passará amanhã (e que não tem outro fundamento além da associação de idéias, the trayan of imagination), Hobbes admite a existência de uma lógica pura, perfeitamente racional. Mas a essa lógica só concernem símbolos, palavras (Hobbes é nominalista). Se definirmos rigorosamente as palavras e as regras do emprego dos signos, podemos chegar a conclusões rigorosas, isto é, idênticas aos princípios de que partimos. Mas trata-se de um jogo do pensamento, estranho às realidades concretas.

A filosofia de Hobbes é materialista e mecanicista. Assim como a percepção é explicada mecanicamente a partir das excitações transmitidas pelo cérebro, assim a moral se reduz ao interesse e à paixão. Na fonte de todos os nossos valores, há o que Hobbes denomina endeavour, em inglês, e conatus, em latim, isto é, o instinto de conservação ou, mais exatamente, de afirmação e de crescimento de si próprio; esforço próprio a todos os seres para unir-se ao que lhes agrada e fugir do que lhes desagrada (esse tema do conatus será reencontrado no spinozismo).

É partindo de tais fundamentos psicológicos que Hobbes elabora sua justificação do despotismo. O absolutismo da época de Hobbes geralmente se apóia na teologia (Deus teria investido os reis de seu poder absoluto). Hobbes, ao justificar o poder absoluto do soberano, descobre-lhe uma origem natural.

Para ele, o direito, em todos os casos, reduz-se à força; mas distingue dois momentos na história da humanidade: o estado natural e o estado político. No estado natural, o poder de cada um é medido por seu poder real; cada um tem exatamente tanto de direito quanto de força e todos só pensam na própria conservação e nos interesses pessoais. Para Hobbes, o homem se distingue dos insetos sociais, como as abelhas e as formigas; por isso, o homem não possui instinto social. Ele não é sociável por natureza e só o será por acidente.

Para compreender como o homem se resolve a criar a instituição artificial do governo, basta descrever o que se passa no estado natural; o homem, por natureza, procura ultrapassar todos os seus semelhantes: ele não busca apenas a satisfação de suas necessidades naturais, mas sobretudo as alegrias da vaidade (pride). O maior sofrimento é ser desprezado. Assim sendo, o ofendido procura vingar-se, mas - observa Hobbes, antecipando aqui os temas hegelianos - comumente não deseja a morte de seu adversário e deseja seu cativeiro a fim de poder ler, em seu olhar atemorizado e submisso, o reconhecimento de sua própria superioridade.

É claro que esse estado, em que cada um procura senão a morte, ao menos a sujeição do outro, é um estado extremamente infeliz. As expressões pelas quais Hobbes o descreve são célebres: "Homo homini lupus", o homem é o lobo do homem; "Bellum omnium contra omnes", é a guerra de todos contra todos. Não pensemos que mesmo os homens mais robustos desfrutem tranqüilamente as vitórias que sua força lhe assegura. Aquele que possui grande força muscular não está ao abrigo da astúcia do mais fraco. Este último - por maquinação secreta ou a partir de hábeis alianças - sempre é o suficientemente forte para vencer o mais forte. Por conseguinte, ao invés de uma desigualdade, é uma espécie de igualdade dos homens no estado natural que faz sua infelicidade. Pois, em definitivo, ninguém está protegido; o estado natural é, para todos, um estado de insegurança e de angústia.

Assim sendo, o homem sempre tem medo de ser morto ou escravizado e esse temor, em última instância mais poderoso do que o orgulho, é a paixão que vai dar a palavra à razão. (Essa psicologia da vaidade e do medo é, em Hobbes, uma espécie de laicização da oposição teológica entre o orgulho espiritual e o temor a Deus ou humildade.) É o medo, portanto, que vai obrigar os homens a fundarem um estado social e a autoridade política.

Os homens, portanto, vão se encarregar de estabelecer a paz e a segurança. Só haverá paz concretizável se cada um renunciar ao direito absoluto que tem sobre todas as coisas. Isto só será possível se cada um abdicar de seus direitos absolutos em favor de um soberano que, ao herdar os direitos de todos, terá um poder absoluto. Não existe aí a intervenção de uma exigência moral. Simplesmente o medo é maior do que a vaidade e os homens concordam em transmitir todos os seus poderes a um soberano. Quanto a este último, notemo-lo bem, ele é o senhor absoluto desde então, mas não possui o menor compromisso em relação a seus súditos.

Seu direito não tem outro limite que seu poder e sua vontade. No estado de sociedade, como no de natureza, a força é a única medida do direito. No estado social, o monopólio da força pertence ao soberano. Houve, da parte de cada indivíduo, uma atemorizada renúncia do seu próprio poder. Mas não houve pacto nem contrato, o que houve, como diz Halbwachs, foi "uma alienação e não uma delegação de poderes". O efeito comum do poder consistirá, para todos, na segurança, uma vez que o soberano terá, de fato, o maior interesse em fazer reinar a ordem se quiser permanecer no poder. Apesar de tudo, esse poder absoluto permanece um poder de fato que encontrará seus limites no dia em que os súditos preferirem morrer do que obedecer. Em todo caso, esta á a origem psicológica que Hobbes atribui ao poder despótico. Ele chama de Leviatã ao seu estado totalitário em lembrança de uma passagem da Bíblia (Jó XLI) em que tal palavra designa um animal monstruoso, cruel e invencível que é o rei dos orgulhosos.

Finalmente, o totalitarismo de Hobbes submete - apesar de prudentes reservas - o poder religioso ao poder político. Assim é que ele exclui o "papismo" e o "presbiterianismo" por causa "dessa autoridade que alguns concedem ao papa em reinos que não lhe pertencem ou que alguns bispos, em suas dioceses, querem usurpar".